25.8.09


Verónica 15€
PILOTO 05(?)-1994/08-2008
Tinhas uns olhos enormes,
Redondos como duas bolotas,
Castanhos e do tamanho
Da tua incomensurável bondade.
Tinhas uns olhos líquidos
Em que todo o amor estava concentrado
E bastaria uma ínfima porção
Para fazer toneladas de amor
Instantâneo.
Poção poderosa, esse amor dos teus olhos.
Tinhas um focinho quadrado
Que o tempo tornou branco
Mas que em tempos fora castanho
E quadrado.
Quando dormias
E sonhavas
Ressonavas alto
E o teu focinho latejava
Vida palpitando
Com o sono e o sonho.
Tinhas umas sobrancelhas hirsutas
Como um velho ancião
Eram quatro-olhos
Que me protegiam dos maus-olhados
E me mantinham alinhada com o universo.
Tinhas o pêlo castanho,
O pêlo mais parecido com o de uma raposa
Que eu já vi.
Quando olhavas para mim,
Toda a bondade do mundo me atravessava
E uma onda de consolação
Se abatia sobre este hemisfério.
Ficará para sempre um mistério
Saber se pensavas, ou não.
Pois um olhar tão penetrante,
Sem pestanejar,
Só pode trazer consigo formas ocultas
De conhecimento das únicas coisas
Que dão sentido à vida.
Quando te abraçava,
Todo o hemisfério girava sobre os eixos.
A vida fazia sentido.
A esperança era um verbo que se conjugava sozinho
E eu queria tanto estar viva
Só para te fazer companhia.
Vem, fica comigo.
Fazes-me falta.
Fica, não partas já.
Deixa-te ficar perto de mim, a velar.
Acompanha-me para todo o lado.
Deixa que converse contigo
E passe, ainda uma vez mais,
A mão sobre o teu pêlo.
Que agarre o teu corpo e sinta
O seu calor único
Grávido de ternura.
Que o mantenha colado ao meu coração
Para baterem juntos,
Compassadamente.
Sístole e diástole da minha saudade.
Vem, ainda, vem.
Os mortos são mortos porque desistem.
Por isso, resiste comigo ao esquecimento
E ao poder do tempo.
Ouçamos juntos os sons da madrugada
E entremos juntos na noite
Da nossa grande amizade.
Sim, tu estás aqui.
Paguei alto o preço para te ter
Para sempre
Livre do sofrimento.
Por isso entremos juntos na noite.
Os mortos são mortos
Porque não se esquecem.

Verónica

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